quarta-feira, 31 de outubro de 2018

E que tal a Moda do Planeta?

Já quis ter publicado este post há umas semanas atrás, mas na impossibilidade... aqui está.

Parece que o outono se instalou de vez em Portugal. Como é que sabemos que ele chegou? É simples, ficamos confusos porque ACHAMOS que é outono, mas lá fora o tempo ou está típico de Inverno ou típico de verão. Neste caso, trata-se da primeira situação. Bora lá vestir uns vestidinhos ou calções com aquele collanzinho transparente, umas camisolinhas de malha daquela ainda leve, uns casaquinhos de ganga... só que não.

Se numa semana vesti calções e t-shirt, na seguinte nem deu para passar pela fase da roupa de meia estação. Friorenta ao cubo como sou, lá tive que ir resgatar precocemente ao roupeiro os casacos quentinhos, as calças de ganga, as camisolas mais peludas, galochas (mais triste não pode ficar)... e pronto, lá se foram as ideias de mudas de roupa outonais que tinha planeado para um início normal de outono. 

Já acabaram os dias de sol e as ondas de calor de Agosto. Ventania com fartura, temperaturas já a roçar o inverno rigoroso e a chuva. Espero que se cale agora aquela malta infeliz que, durante os já habituais verões portugueses prolongados (como este ano não foi o caso), começa, mal se dá por isso, a desejar de volta “as mantinhas, as lareirinhas, as camisolas de manga comprida, as botinhas, a chuvinha.”

Que verão houve este ano em Portugal? Usei camisolas de lã até Abril, Maio – tenho fotos do meu aniversário que o comprovam! Fui (forçosamente) à praia com os meus alunos nas três primeiras semanas de Julho, e em 15 dias úteis de praia, só 3 ou 4 foram de sol e de calor à vontade, em que me pude despir e ficar de biquini, sem nevoeiros matinais, chuviscos, céu cinzento, ventania a percorrer o areal ou basicamente sujeita a apanhar uma constipação!


O aspeto das manhãs do passado  mês de Julho, na praia da Torre, em Oeiras

Ok que Agosto entrou a matar com uma onda de calor dos infernos. Mas esses foram os únicos dias em que pude efetivamente nadar nas águas da linha de Cascais! Foram os melhores dias de praia que tive. Os únicos dias em que usei tops sem trazer o casaquinho atrás, ou usar calções ou saias sem aquele friozinho desagradável das noites de verão. “Ai, mas não aguento estar na praia com tanto calor!” Pois, eu cá não aguento as águas frias de Portugal continental, nem já sequer as do Algarve. Pelo que só consegui entrar na água nesses dias de calor sufocante. Se puderem um dia visitar Benidorm, que não fica assim tão longe nem é a viagem mais cara das vossas vidas, aí sim venham dizer-me depois o que são águas quentinhas. Por muito friorenta que seja, não me tentem convencer de que a água do mar em Portugal é  agradável. Porque, pelo contrário, está a esfriar de verão para verão em todo o território. O Algarve está deplorável e não faz mais jus à fama que tinha. Não me tentem negar isto!

Dizem que os portugueses passam a vida a falar do tempo, geralmente sempre insatisfeitos com o estado meteorológico que se lhes apresenta no momento. Se está frio e não pára de chover, querem que venha sol. Mas depois o sol vem e já é quente demais. Seguidamente lá começa a vir a vontade de largar os quispos, os cachecóis, mostrar mais um pouco de pele, porque enfim, já cheira a festivais, já não nos entendemos com os bad hair days trazidos pela chuva. Queremos verão, praia, perna à mostra, biquinis, bronze, sedução, e mariquices afins.

Sou portuguesa, também falo sobre o tempo e chateio-me com ele. Agora, se há coisa que nunca vão ouvir da minha boca é “Ai, que saudades do inverno, das mantinhas, da chuvinha, dos casaquinhos” e restantes tretinhas. Sou uma miúda do Verão. Adoro praia, não para estar parada numa toalha de papo para o ar a apanhar sol, mas para mergulhar e nadar toda a tarde. Para caminhar ou correr ao longo da margem. Vou à praia para me mexer. Se quero descansar fico em casa, a apanhar sol na varanda, ou a dormir sestas no sofá. Praia é mar. É a alegria de poder nadar, é estar feliz, é movimento.

E não vou esconder que estou chateada com a porcaria de verão que tivemos este ano. Chegou tardíssimo e foi mega curto. Mas este facto esconde algo ainda mais grave, e do qual o português ou não sabe ou não quer falar porque implica mais do que small talk acerca do estado do tempo:

Gente, a linha que separa o verão do inverno está cada vez mais ténue no nosso país. A primavera e o outono então, quase nem têm tempo de antena, porque passamos de oito para oitenta num ápice, ao longo do ano. Se ontem estiveram 32 graus, amanhã são capazes de vir já uns 12. Para aqueles  que medem a meteorologia usando a roupa, é aquela dor de cabeça do “não sei o que vestir.” Porque ontem esteve um dia maravilhoso de verão, ainda de pé ao léu e hoje já está a chover a potes, e calçar umas galochas é só assim estranho e meio desconcertante. Aconteceu-me. Problemas mortais. Eis o verdadeiro problema:

Rasto do Leslie, a pior tempestade a pisar solo português desde 1842

O furacão Leslie já passou e saiu de Portugal. Há uns valentes dias... e ainda há pessoas a falar nisso. Não só se achou que ia ser o fim do mundo em cuecas, como tive duas chamadas alarmistas e altamente ridículas da minha mãe e da minha avó, que me aconselharam a não passar a noite sozinha em casa, acredite-se... porque, creio, na ideia delas, um prédio robusto de 5 andares como o meu ia certamente desabar todo em cima de mim...
Não querendo desfazer do fenómeno, que acabou por atingir de modo mais imperdoável o norte do país, por terras sintrenses foi só mais um dia normal e cheio de ventania, trazida pela habitual junção do efeito da proximidade do mar e da Serra de Sintra.

Isto de furacões em Portugal é raro. Foi novidade. O suficiente para colocar o povo em polvorosa. Coisas sérias: Há quem diga que Portugal vai, aos poucos, adquirir as características meteorológicas de uma Tunísia. Quente, árido e com pouca chuva. Num ano em que foi dito que se esgotaram oficialmente os recursos naturais do Planeta, assistimos a ondas de calor cada vez mais impiedosas, terramotos diários em diferentes partes do mundo e agora... um furacão Leslie, num país onde não existem furacões, que alarmou toda a gente. Então mas os furacões não eram mais típicos de uma América? Nos States são o prato do dia...

Pois é, mas tal como os especialistas que defendem um cenário tunisino para Portugal daqui a uns tempos, há também os que dizem que vamos ser visitados por furacões muito mais vezes e que estes vão passar a ser cada vez mais frequentes em terras lusitanas.

Então e que tal pensar sobre estes fenómenos meteorológicos? Não? Nos porquês? A Terra está cada vez mais quente e as placas tectónicas vão mexer-se com mais frequência, com o calor que aumenta de ano para ano. A atmosfera está saturada de tudo o que é tóxico e a natureza não podia estar mais confusa. Seriam precisas 1,7 Terras para sustentar o atual nível estimado de recursos necessários às atividades humanas - é tão simples e grave como isto. O que fazemos para ajudar? Queixamo-nos. Queremos verão quando está frio, e queremos inverno quando está calor. Não reciclamos, não abrandamos o consumismo, não mudamos comportamentos. As nossas modas egoístas sobrepõem-se a tudo o resto. Os invernos portugueses são cada vez mais longos e rigorosos, a chuva insuficiente, os verões curtos, e as estações intermédias inexistentes.
Pior do que isto, só ver imagens como esta, divulgadas este ano.

Poluição ao largo de uma Ilha no Pacífico

O que é que cada um de nós faz? Assistimos, impávidos, chateados com a mudança das estações. Preocupamo-nos com o que vestir, com os cabelos estragados pela chuva, com os verões demasiado curtos (sou suspeita,vá). Preocupamo-nos com adesões a mil e um direitos humanos da moda, morremos a tirar selfies, juntamo-nos a movimentos só porque sim. Fingimo-nos cultos e doutrinados em mil e um assuntos, citamos quotes infelizes da internet para provar que temos algo de filósofo em nós. Queremos acreditar que somos diferentes e especiais através de demandas pouco realistas.Temos os olhos colados aos ecrãs dos telemóveis desde que acordamos até nos deitarmos. Mas somos incapazes de erguer os olhos para a Natureza.

Relembro com alguma nostalgia os tempos de criança em que haviam programas televisivos dedicados a informar sobre o planeta, o ambiente e como o defender, com os quais aprendi. Denver o Dinossauro, Widget o Extraterrestre, Ocean Girl, O Verdocas. Bolas, tínhamos o Michael Jackson, que dedicava álbuns inteiros e singles ao planeta e à defesa do ambiente. Ainda hoje é a celebridade mais caridosa registada no Guiness World Book of Records, que mais doou da própria fortuna para ajudar o Ambiente (e outras importantes causas humanitárias). Onde está manifesta a preocupação com o planeta entre os artistas de hoje em dia? Porque é que isso deixou de ser moda? Já agora, porque é que o Ambiente e o Planeta têm de chegar ao estatuto de Modas para que as pessoas as sigam?

Desde quando é que o ambiente deixou de ser um assunto prioritário? Como poderão existir quaisquer direitos humanos pelos quais lutar, se não existir um planeta primeiro?
Porque é que ninguém recicla e faz a sua parte? Porque é que continuamos a preferir o transporte próprio ao transporte público? Porque é que é tão importante para tanta gente ter um carro? Ainda por cima poluidor? Porque é que se compra compulsivamente? Em marcas que pouco se preocupam pelo ambiente? Porque é que não reduzimos o consumo de animais? Porquê o contínuo e desrespeitoso hábito de deitar lixo ao chão? Ou pelas janelas?! Porque é que o português suja, destrói, rouba, vandaliza? Temos uma das capitais mais sujas da Europa. Uma Lisboa colorida, musical, bonita, mas poluída e grafitada por todo o lado...  E não teria onde acabar a lista.

Que linda, a nossa Lisboa
Quando era pequena pedi aos meus pais que comprássemos um daqueles ecopontos de ter em casa. Os separadores eram demasiado pequenos e enchiam-se várias vezes ao dia. Acabou por não ser tão prático por essa razão. Mas o hábito ficou, e apesar de não ser perfeita, dou o meu contributo ao planeta, separando cuidadosamente o plástico, do papel, do vidro. Cada material num saco. Serei sempre defensora do ambiente e da Natureza. Não há que ter um ecoponto bonito, por vezes pouco prático e caro dentro de casa. Sacos do lixo e boa vontade servem. Mas cheguei ao extremo de conhecer um vegetariano que nem a separação do lixo fazia. Os vegetarianos, que são os primeiros a ter o Ambiente ao peito, a falhar em algo tão simples e básico como a separação adequada do lixo.


Gostava muito que as pessoas parassem com modas pouco urgentes e pensassem em coisas sérias de verdade. O ambiente TEM de ser respeitado porque (novidade!) é a nossa casa. Antes de nos debruçarmos sobre os problemas da nossa casa, há que efetivamente TER uma casa. Antes de aderirmos ao movimento da moda, nos queixarmos do tempo que faz, da chatice que é, das roupas que não sabemos quais vestir, pensemos no planeta, no que fazemos por ele, e se merecemos mais do que aquilo que ele (egoisticamente) nos continua a dar. Num mundo em que as modas fazem as pessoas, se for necessário elevar o estatuto da Terra a uma moda, que seja. É triste, porque Ela é muito mais do que isso. Ainda mais tristes são os que não vêem isso. Os que não A vêem.

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