terça-feira, 15 de setembro de 2020

Malta que está nos 20s ou nos 30s – Está tudo bem!

 Ninguém tem a vida completamente planeada. (ou nada planeada!) Nem mesmo aquele colega de escola que publica fotos da sua nova casa, que fala do novo emprego aparentemente espectacular ou do filho recém-nascido, nas redes sociais. Pode parecer que tem tudo sob controle, mas na realidade, nem ele faz a menor ideia do que está a fazer. Estamos todos apenas a dar as nossas primeiras tentativas em sermos bem sucedidos na vida adulta - tão esperada de nós - o melhor possível. Mas estamos a fazer melhor do que aquilo que julgamos.



1. Um emprego é um emprego. Não importa se trabalhas na Bolsa de Valores ou na caixa do Mc’Donalds. Ninguém tem o direito de nos fazer sentir mal quanto ao nosso ganho financeiro. Sujar as mãos ou lidar com queixas diárias de clientes não é certamente tão glamoroso quanto trabalhar atrás de um computador numa secretária bonita, mas é trabalho igualmente duro, necessário, válido e honrado.

 2. Somos todos uns grandes mentirosos. Todos aqueles amigos do Facebook ou do Instagram que invejamos não são assim tão felizes como aparentam. É claro que não publicam fotos do seu apartamento antiquado, com chão partido ou com papel de parede encardido; Muitos vão esperar até ao dia em que irão excepcionalmente a um restaurante de 5 estrelas para publicar fotos nesse lugar; Não se espera que publiquem fotos das discussões que tiveram com o companheiro durante a espera  horrorosa de 16h no aeroporto, antes da tão espetacular viagem a Punta Cana; Há ainda aqueles que se ausentam das redes durante meses a fio, porque só publicam as fotos em que surgem de férias, em passeios originais ou em festas, para dar a ideia de que as suas vidas são só férias, passeios originais e festas. Não condeno quem se comporta desta maneira porque não posso julgar as vítimas da sociedade altamente superficial em que vivemos, incluíndo eu. Mas muitos se esquecem de que as pessoas só mostram aquilo que querem mostrar: geralmente só o lado ultra fixe (às vezes inexistente) das suas vidas. E é por isso que todos parecem estar a viver uma vidazorra do caraças, menos nós. -  quando na verdade, todos temos vidas imperfeitas e mil problemas que não expomos. 

 3. Cada pessoa tem o seu ritmo. Pode custar muito ser o único da antiga turma da primária que ainda está a terminar o doutoramento, ou a viver debaixo do tecto da mãe. Mas cada um de nós tem de fazer aquilo que é melhor para si, ao seu ritmo. Cada pessoa tem o seu tempo, e juntar o máximo de dinheiro possível antes de tomar qualquer decisão drástica é o melhor a fazer. Para mim, foi relativamente fácil e descomplicado sair de casa dos pais – e uma das  conquistas mais desejadas da minha vida – mas para outros da mesma idade pode ser um desafio duro e desencorajador, dependendo da capacidade de independência e também da maturidade emocional de cada um. Em boa verdade, de pouco serve sair do ninho estando mal preparado, para, no ano seguinte, voltar derrotado à casa dos pais.

 4. Ainda há muito tempo para decidirmos o que queremos. E quem já sabe quais as suas paixões tem metade do percurso feito. Mesmo que seja um percurso longo, há que saber dar valor ao facto de já sabermos o que queremos. E é claro que há mais do que tempo para decidir que caminho seguir. Em nenhuma idade é tarde demais para voltar aos estudos ou mudar de carreira profissional. Há muito que os 30 já deixaram de ser um obstáculo ao reiniciar - ou mesmo começar - da nossa vida.

 5. E que tal pararmos com as comparações? São puro veneno e não fazem senão dar-nos uma falsa ideia de fracasso. O sucesso das outras pessoas em nada diminui o nosso valor nem as nossas próprias conquistas, por muito que sejam mais pequenas. Cada pessoa tem o seu contexto e a sua linha de tempo. As suas prioridades e as suas metas. E quantas vezes não nos comparamos com aquilo que parecem coisas boas demais para serem verdade, e com vidas que escondem problemas duros, dos quais nada sabemos?

6. Os relacionamentos não são tudo. Se andam a namorar, boa. Se já têm o anel no dedo, ótimo. Se estão para ter bebé, felicidades. Mas estar solteiro não é motivo para stressar, nem sinónimo de se estar infeliz ou mal na vida. Há quem espere até aos trintas e quarentas para assentar. E há quem nunca assente de todo, e mesmo assim viva vidas plenas e com significado. Um parceiro ou filhos não têm de ser a peça que nos falta, em nada.

 7. Os pequenos sucessos também importam. Conseguem cozinhar as próprias refeições? Lavar e engomar a própria roupa? Semear uma planta numa mini horta e cuidar dela? Ou cuidar de um animal? Não devemos desvalorizar os pequenos sucessos, só porque achamos serem coisas que “já toda a gente devia saber fazer.” Há que sermos felizes por conseguirmos sobreviver sozinhos. Há por aí muitos que aos quarenta anos ainda nem sequer sabem dobrar uma camisola, e cuja mãe ainda vai a casa fazer de criada, todos os meses. Acreditem, conheço casos desses.

8. O mundo mudou. Que se danem aqueles parentes retrógados que têm sempre a frase “No meu tempo...” à saída da boca, e que se gabam de que saíram de casa com 16 anos e que aos 18 já eram casados, que aos 30 já tinham 5 filhos, e que chegaram a bisavós. Isso era tudo muito bonito quando o custo de vida era mais baixo, quando não lhes eram pedidos mil diplomas, licenciaturas e experiência para ter um emprego, e quando não se davam sequer ao trabalho de conhecerem bem os parceiros antes de saltarem para muitos dos casamentos abusivos que arruinaram muitas das suas vidas. Hoje a vida é caríssima, os salários não acompanham a evolução e caprichos da sociedade actual e comprar casa em Portugal é como fantasiar com a compra do palácio de Versailhes. Mas ao menos, a maioria de nós tem tempo e amor-próprio o suficiente para procurar o companheiro mais ideal possível, sem saltar para um casamento forçado, às cegas. O que me leva a...

 9. Acreditemos ou não, ainda somos todos jovens. Mesmo que sintamos que já devíamos ter a vida toda descodificada e planeada, o que quer que isso signifique, e por estarmos mais velhos do que alguma vez fomos, a verdade é que ainda somos jovens. Não podemos considerar-nos falhados assim com tanta rapidez. Estamos em controlo da nossa vida e podemos fazer dela o que quisermos.

10. Está tudo bem! Ao fim de 29 anos a frequentar este planeta, chego à conclusão de que nenhum de nós faz grande ideia do que raio andamos aqui a fazer. Claro que alguns de nós entendem melhor o funcionamento deste sistema, mas ninguém sabe ou questiona sequer os porquês de tudo isto que é a nossa vida. Limitamo-nos a seguir aquilo que nos foi dito para fazer, por pais, professores e patrões. E nenhum deles sabe tão pouco o que está a fazer; limitam-se a seguir o exemplo de outros alguéns.

 

É muito libertador quando todos entendemos isto; o facto de que ninguém faz ideia do que está a fazer, que há sempre partes da nossa vida que nos faltam, que a vida não devia ser assim ou “só isto”, que todos temos dúvidas e medo, que todos nos sentimos assustados com o avançar do tempo e que na nossa mente, temos todos uns 5 ou 6 anos de idade a menos. Há muitos de nós que escondem tudo isto e seguem em frente com as vidas mecanizadas e autómatas que nos disseram para seguir. Acreditamos em anúncios e em programas de televisão, que não estão a fazer senão dinheiro à conta da vida irreal que nos tentam fazer acreditar que devemos viver.

Aqueles que parecem “mais avançados na vida” do que nós, também não têm ainda ideia daquilo que se passa. Simplesmente são melhores a jogar o jogo da sociedade e pensam que essa demanda vai responder-lhes a todas as suas questões. E depois existem os “avançados” que inferiorizam e humilham quem ainda não chegou onde “já devia ter chegado”, por estar numa certa idade, por estar ainda “atrasado na vida”... Tudo expressões e modos de perspectiva improdutivas.

É importante percebermos que a vida não é uma competição, nem  uma maratona. Não existem pessoas avançadas ou atrasadas no seu percurso. Não há uma vitória no fim, não há celebração, não vai lá estar ninguém a aplaudir os nossos feitos ou a julgar os nossos fracassos quando ela acabar. Morremos -  é essa a linha de chegada. E estamos todos a correr como se o objectivo fosse chegar lá mais cedo. A vida não é uma corrida. Ninguém ganha. A vida é uma canção... e devíamos dançar e cantar enquanto ela toca.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

Falemos de Fotografia (e do Instagram)

O Instagram existe há já uma década, mas para mim existe apenas há 16 meses. Depois de anos a ouvir sistematicamente “como assim não tens Facebook nem Instagram?", lá cedi ao fenómeno e à curiosidade.

Digamos que o primeiro nunca me atraiu; Não me identificava com o conteúdo do Facebook nem com o ambiente de gente maioritariamente de meia idade, muitos deles mal formados, a destilar ódio, ignorância e veneno em cada publicação de importância banal. O teor demasiado público e a facilidade com que as pessoas faziam (e ainda fazem) questão de expor qualquer futilidade que lhes acontecesse, (selfies com queixas de que estão nas urgências com 20 pessoas à frente, por exemplo) o interior de toda a nova casa, o carro novo com a matrícula visível ou a sobreexposição dos filhos menores, muitas vezes bebés - o que pessoalmente condeno - nunca me agradaram.

Contudo, sempre tive uma ideia um pouco mais agradável do Instagram. Sempre achei que tivesse uma conotação mais visual, onde não fosse tão frequente nem exagerado aquilo que cada um partilha sobre si. Uma rede ideal para partilhar conteúdo artístico, como o que me agrada.  

Então, em Outubro de 2018 publiquei o meu primeiro post e comecei a partilhar aos poucos, com o mundo, pedaços daquilo que sou, das minhas Artes e das minhas paixões, sempre a um nível visual e muito superficial. Ao fim de mais de um ano a instagramar, tenho a minha opinião formada sobre o Instagram. Sobre as suas vantagens e problemas. Mas hoje queria partilhar a minha opinião sobre a Fotografia, uma muito antiga paixão minha, e que é a base desta rede social.

Apesar de, como já referi várias vezes neste blog e em posts do Instagram, não ser prisioneira do meu aspecto, adoro aprumar-me para sair e divertir-me a tirar fotos em dias em que me sinto particularmente gira. Com mais ou menos maquilhagem, de sorriso mais ou menos aberto e com poses maioritariamente naturais, adoro brincar em frente a uma câmara. 

Por detrás das muitas fotos "bonitas" que partilho no Instagram, há imensa brincadeira entre cliques. É um lado meu que também gosto de mostrar.   


Também gosto de fotografar, e para uma amadora como eu, penso que até me safo muito bem com composições fotográficas. Compor o meu feed e ver feeds de outros utilizadores estimula-me imenso, visualmente. E a estimulação visual (ou artística de qualquer tipo) funciona como combustível para a minha alma. Bonito, mas é assim mesmo. Quem for das Artes compreenderá.

Bonitos são também muitos dos feeds que sigo. Alguns a roçar a impecabilidade visual de um modo dolorosamente artificial. Estrategicamente construídos de modo a que as cores combinem harmoniosamente de uma publicação para a outra; feeds de utilizadoras que todos os dias - TODOS os dias - arrastam um namorado à beira da loucura, para a rua, para que este fotografe os mil outfits diferentes para publicar durante a semana (e estes casos são tão óbvios como cringey); poses e semblantes demasiado altivos e artificiais, cenários demasiado perfeitos para fazerem parte de um dia a dia credivelmente normal, publicações que não passam de publicidade atrás de publicidade exaustiva a mil e uma marcas e produtos da moda diferentes...

Tudo fotografias bonitas, na verdade.

E não há nada de errado em publicarmos as nossas fotos bonitas - desde que tirar fotos bonitas não seja a única razão pela qual as tiramos. E desde que as fotos bonitas assim o sejam porque nós o decidimos e não porque o feed de uma blogger de moda ou de viagens qualquer nos disse que eram.

Tenho mais do que fazer do que perder neurónios a pensar no que vou fazer à minha vida se hoje decidir publicar uma foto de fundo berrante, que em nada condiz com as cores das 8 fotos anteriores do meu feed, se só recebo cerca de 30–50 likes por publicação, podendo ter quiçá o triplo, se ganho ou perco seguidores. E por muito que haja quem ganhe a vida à conta da perfeição de todas essas variáveis, do conteúdo e dos números do seu Instagram... São só fotos. Por vezes demasiado pensadas para os outros. E é aí que queria chegar:

Entristece-me ver que somos uma geração que se esqueceu de tirar fotos para si mesmos. Estamos tão inconscientemente focados naquilo que possamos considerar a perfeição de uma fotografia que há muito que já esquecemos do quão simples e desfrutável é captarmos momentos para ninguém outrem que nós mesmos.

Apesar de adorar Moda e de gostar de posar para fotos, também sou muito despreocupada, nada agarrada à imagem, e divirto-me genuinamente a tirar fotos.

Esquecemo-nos das gargalhadas que se soltavam nos tempos de estudante, de cada vez que um amigo nos tirava uma foto despreocupada, com as bocas escancaradas de modo estranho - porque hoje pedimos-lhe que apague semelhante foto imediatamente, sem sequer pensar duas vezes.

Esquecemo-nos de como ser brincalhões, divertidos, enérgicos e patetas. Em plena era dos Memes, esquecemo-nos ironicamente do quão é bom sermos um pouco malucos e rirmo-nos dos nossos erros. Tornámo-nos tão críticos, que as coisas que outrora nos traziam alegria, incluindo o simples acto de tirar fotografias, são hoje em dia capazes de nos transmitir coisas horríveis como ansiedade, inveja ou stress.

Esquecemo-nos de como ser espontâneos, de como deixar os fios do nosso cabelo ao sabor do vento, do modo mais despreocupado que eles quiserem, de permitir que as nossas barrigas relaxem quando estamos na praia, sem t-shirt, de correr para as ondas do mar de braços abertos e lançarmo-nos lá para dentro sem pensar no quão vamos arruinar o nosso look de praia perfeito. (O que era isso, há uns anos atrás? O que eram pestanas falsas, quilos de bijutaria e eyeliner na praia?)

Esquecemo-nos de como mandar um mergulho desajeitado e hilariante na piscina, de contemplar o pôr-do-sol ou apreciar belas vistas sem a preocupação de termos uma câmara connosco para captar o momento, ou se o próprio local em si é suficientemente "instagramável" e digno ou não de ter o seu espaço no nosso feed.

Esquecemo-nos. E esquecemo-nos porque, bem lá no fundo, muitos de nós se sentem perdidos. Creio que o principal inimigo dos amantes de fotografia (amadores ou profissionais)  deste mundo moderno em que vivemos é a incapacidade de fazermos as próprias escolhas – decidir aquilo que nos parece bonito a nós, o que significa para nós o “espectacular”, o “bem-sucedido”.
O que restará de nós se, à conta da Internet, perdermos a capacidade de nos identificarmos a nós mesmos?


Talvez nos consigamos encontrar, no meio desta selva digital, se mudarmos o modo como olhamos para a Fotografia, e a usemos antes como metáfora para perspectiva:

- De que ângulo queremos ver a nossa vida?
- Qual é a nossa ideia de beleza?
- Como nos podemos editar a nós próprios de modo a conseguirmos viver a nossa vida o melhor possível? E sem a pressão do mundo digital e do Outro?

Os momentos perfeitos não são planeados. São desajeitados, divertidos e memoráveis. Costumam vir acompanhados de grandes sorrisos. E o mundo precisa mais disso.

A realidade para a qual nunca temos tempo para pensar e admitir é a de que nada mais desgasta a alma do ser humano como a ânsia de querer agradar aos outros. Comecemos a tirar fotos pelas memórias, pela captura de momentos e não por nomes de marcas, pela captura de sorrisos genuínos em vez de likes sintéticos, por doses de vida em vez de vislumbres de mera existência, por afirmações positivas vindas de nós mesmos, para nós mesmos, em vez de validação superficial de nomes de utilizadores desprovidos de rosto, que no final de contas, não constituem o menor significado nas nossas vidas nem para a nossa felicidade.

Há muita gente no Instagram, Facebook, e afins redes sociais que precisam de se redescobrir, de viverem do modo como querem, sem deixarem que a sombra das normas da sociedade e do mundo digital bloqueiem a sua luz.

Que, com cada fotografia, brilhemos. Mas que brilhemos primeiramente para nós mesmos, antes de brilharmos seja para quem for.