Há muita coisa que não entendo nas minhas colegas de género,
mulheres. Desde sempre. Sempre fui pessoa de muito poucas amizades, facto que
ainda hoje é real, e ao longo da minha infância e da minha vida, foram muitos
mais os coleguinhas rapazes do que as colegas, o que, para todos os efeitos, é uma tendência que se
mantém.
Gosto muito do meu género, de ser mulher e daquilo que representa.
No entanto, olho muitas vezes em volta, para as mulheres que me rodeiam ou que
vejo, e não consigo identificar-me com a grande maioria. Muito menos com os seus dramas. Ou a simples palavra 'drama'. Estes são alguns deles que, como mulher, não me identifico. Vamos levar as coisas na desportiva, pois não pretendo inferiorizar quem se rege por estes comportamentos. É apenas a minha opinião.
Drama 1: homens. Desde os 10 anos que me aborreço com as típicas conversas de
mulheres sobre homens, relacionamentos, dramas de amor e de desamor. Crises, conflitos,
queixas de namorados ou de maridos, são temas levados ao extremo e dissecados até ao osso por muitas mulheres, em conversas entre si. Os que mais me enjoam mesmo, são aqueles
casos doentios em que as mulheres se queixam ou se sentem vítimas de algo nos
seus relacionamentos e nada fazem para mudar, parecendo viciadas no próprio
drama. Também não suporto as que, apesar de estarem aparentemente bem nos
seus relacionamentos, dizem mal de mil e um comportamentos dos
companheiros com um ridículo subtom de normalidade, que me transcende.
Com 10 anos, namorar, ou sequer pensar nisso, estava ainda a léguas da minha ingenuidade
pré-adolescente. Não olhava para rapazes nenhuns com outros olhos que não os da
amizade, nem estive interessada em namoros até nove anos mais tarde. Não me fez
falta mais cedo, confesso. E tive a bênção de passar a adolescência
inteira sem me gabar de como andei com meio mundo, e de ter assuntos mais profundos sobre os quais me debruçar.
Drama 2: novelas e séries. Nunca tive paciência para ver novelas ou acompanhar
séries de qualquer tipo, porque, pessoalmente, acho que é tempo valioso
desperdiçado diariamente em (mais um) um
compromisso, não produtivo, para o qual já me resta pouco tempo diário. É claro
que cada um dá importância aos compromissos que quer. Mas ser escrava dos écrans
nunca foi para mim. As notícias são a única coisa que me faz ligar a televisão,
e bendita a hora em que passámos a ter acesso às notícias no telemóvel. Gostava
de perguntar às minhas colegas onde arranjam tempo para fazerem actos
inéditos como assistir a maratonas de Netflix, Guerras de Tronos e afins, com
um emprego até às 20h, trânsito, jantar, tarefas domésticas de final de dia e conseguirem
deitar-se a horas decentes para acordarem bem no dia seguinte. Se ainda viverem
com os pais, não conta, sorry.
Drama 3: Beleza. E tudo o que esse eterno mal do mundo nos traz. Ao contrário da
esmagadora maioria das mulheres, não sou obcecada pela Beleza, pelo mundo dos
cosméticos ou pela escravidão do meu aspeto. Gosto, mas há muitas outras coisas de que gosto mais. Sou plenamente consciente da minha
aparência, aceito-a e, regra geral, gosto muito dela. O mundo não me cai aos
pés se acordar com uma borbulha, se o cabelo não está saído de um anúncio da
Pantene ou se as minhas olheiras rastejam pelo chão após uma noite mal dormida. Todas temos maus dias e pequenas coisas físicas em nós que gostaríamos de mudar. Ou não andássemos nós obcecadas com coisas tão ecléticas como lápis de sobrancelhas, ou corretores de olheiras, right? Mas, no geral, sei que o meu todo é um aspeto bonito, elegante, com piores ou melhores dias.
Nem sempre me maquilho para o trabalho, não sou escrava disso. Não sou a maior
fã de óculos de sol nem de pintar as unhas. Não pago contas no cabeleireiro
mensalmente, nem faço loucuras desmedidas com o cabelo a cada dois meses. Vou ao
supermercado de óculos graduados e de fato-de-treino, e arranco olhares
positivos na mesma medida em que os arrancaria se fosse mais produzida -
Simplesmente acho pouco prático vestir-me para o Moda Lisboa só para ir ali ao
lado buscar uma garrafa de sumo. Gastar dezenas de euros em produtos de
maquilhagem ou cosméticos caríssimos em Sephoras é, para mim, o desperdício
de dinheiro mais disparatado. (Tive uma amiga cuja casa de banho era uma réplica da Sephora em tamanho mini, e o que era mais triste, era ver o quão amarga, infeliz e triste ela continuava a ser.)
Gostarmos de nós próprias é muito aliviante, e algo que
infelizmente, muito poucas mulheres fazem e abraçam. Basearmo-nos só em
características exteriores para gostarmos de nós, também é triste. Não fazer um
esforço para mudar aquilo que sabemos que podemos mudar, seja interior ou
exterior, é triste ao cubo. E ao paralelepípedo quando as outras mulheres, que
estão bem, é que são as culpadas dos males das outras. O assunto beleza tira-me imensa paciência.
Drama 4: a maldição das invejas. Percebo e determino perfeitamente que a obsessão das mulheres
pela beleza e a competição entre elas associada parta de um princípio genético.
Está na nossa natureza olharmos umas para as outras como competição, porque
subconscientemente, queremos que um homem nos escolha, tal como nos Primórdios. Essa necessidade de nos sentirmos bonitas e desejadas mantém-se, inconscientemente, com o mesmo objetivo: cativar um parceiro. Mas se outra mulher
se nos apresentar bonita e desejável sentimo-nos ameaçadas e queremos
eliminá-la. Milhões de anos volvidos, vimemos na época do “mas eu visto-me
e arranjo-me para mim.” Totalmente válida, essa intenção.
Mas tenhamos consciência disso ou não, o nosso instinto é sempre o de ser
considerada bonita aos olhos de todos, e ultimadamente, a um parceiro, e o de termos alguma aprovação alheia.
Tive, desde cedo, muitos probleminhas de
invejas com mulheres. Alguns desses foram imensamente tristes e algumas
marcaram a minha infância, adolescência e atual juventude. Muitas delas foram amigas de longa data, cuja inveja foi dando cabo da amizade, chegando até ao ponto de interferir pessoalmente com a minha própria família. Ter tido colegas a dizerem na minha cara que invejam mil e uma coisas minhas, de modo agressivo e
ciumento, é triste de relembrar. Desde parvoíces como aptidão para desenhar, cabelo e corpo, atenção masculina, notas académicas, passando pela personalidade.
Não
tenho o hábito de guardar sentimentos rancorosos para com ninguém no meu
coração. É bonito, mas é mesmo assim. É um desgaste, uma perda de tempo e
simplesmente tenho mais em que pensar do que me estar a preocupar se aquela
tipa que passou por mim tem um cabelo excelente ou umas curvas estonteantes,
quando eu também gosto do meu cabelo e das minhas curvas. Ou é mais alta que
eu. Ou é mais extrovertida que eu. Quanto muito, uso a visão que tenho dessa
pessoa para me inspirar ou para melhorar coisas em mim. Talvez me inspire no
cabelo dela para adaptar aquele corte de cabelo ao meu, quanto muito. Certo? Inveja
saudável, sim! Para nos melhorarmos e evoluirmos. Não para fazermos ferro com
as outras mulheres. Há tanta coisa mais importante neste mundo do que pensarmos se estamos bonitas 24h/24h.
Christina, não te serviu de nada |
Drama 4: as dietas, os quilos a mais e os ginásios. GOD!!! Não tenho
mesmo paciência para este tópico! Parece que se pratica toda uma religião envaidecida à
volta de uma coisa simples que devia ser, supostamente, apenas o estilo de vida
particular de cada um! Porquê esta constante necessidade de aprovação alheia?
De apregoar aos quatro cantos do mundo o que comem, quantas calorias tem, os
ingredientes que levou, quantos quilos já perderam ou ganharam? Alguém me diga
que não estou louca e que isto tem de ser dos assuntos mais secantes de sempre
com os quais gastar saliva!
Durante o meu estágio, as minhas colegas de turma
reuniam-se para almoçar todos os dias.
Sentava-me com elas e, fossem 15 minutos, fosse uma hora, a conversa não saía
fora de Tupperwares, comidas de marmita, a lancheira mais in do momento, as refeições feitas na Bimby, as
saladas de quinoa, as comidas vegetarianas, as calorias que eram só aquelas, as idas ao ginásio para
squats às 6h da manhã antes das aulas, para alcançar X centímetros de rabo (SIM, esta conversa foi real!), as comidas de casa que levaram X, Y e Z ingredientes, o
interesse entediante em querer ouvir e partilhar receitas intermináveis
e.... a pior de todas as questões: os
olhares fulminantes quando a Melissa surgia com um tabuleiro bem recheado, da
bela da cantina da empresa, bem abastecido de comida, batatas fritas,
SOBREMESA (aqui o mundo treme), bolachinhas doces e leite com chocolate para o
lanche. E ainda um Mars. (Morre tudo. Cai o pano.)
Não tenho culpa de ser elegante e poder comer tudo aquilo sem engordar. Nunca tive tendência para engordar e sempre tive um peso constante. Como de tudo e
muito, especialmente quando estou a morrer de fome. Mas há que ter em conta
certas situações: não sou viciada em doces, nem em fast food, pelo que não
tenho problemas de aumento de peso quando me apetece comê-los. Não sou viciada
em Nutella nem em doces, nem dou desculpas esfarrapadas para os comer,
recorrendo ao oh-tão-conveniente “estou naqueles dias do mês” ou estados de espírito, que muitas meninas
invocam. Não olho para a comida como "comfort food." Como imensos vegetais e aos três pratos de sopa por vez. Caminho muito
e gosto de corridas, apesar de não ser constante a regularidade com que as
faço, e isto relembra-me de outro "drama": Há pouco tempo a @killyourbarbies, minha
prima, conterrânea e colega de infância, mencionou o estigma em volta das
pessoas magras que sofrem, digamos, de uma espécie de shamming ou comentários
ignorantes por serem magras. Não pude deixar de me identificar.
Comentários como: “És magra, porque fazes
desporto?” são simplesmente cómicos.
Senhoras mais gordinhas: o desporto é para
todos os pesos. Nem toda a gente faz desporto só para perder peso! Há quem queira
ganhar músculo, força de braços, melhorar a respiração, aumentar o tamanho do
rabo (é válido, pronto!), ou simplesmente sentir-se ativo e feliz! Ou não sabiam?
Com 27 anos, quis acreditar que as
quezílias de adolescente e comportamentos infantis se desvaneceriam com a
idade, nas mulheres com quem vou lidando. Infelizmente encontro muita mulher tão ou mais velha do que eu, cuja
mentalidade ficou parada nos 12 anos.
Levante a mão quem se identifica com estes
cenários. Façamos um teatro, para se perceber bem:
Cenário
1:
Eu: Estive em Paris o ano passado, visitei
a cidade e ainda voltei a ver a Disneyland ao fim de 14 anos.
Ela: Ah, sim! Eu e o meu namorado fomos recentemente
à Disneyland, mas em Orlando! A maior Disneyland do mundo e a primeira de
todas! Estivémos um mês nos States: de Lisboa para Miami, depois
Orlando, depois no Tenessee, Philadelphia, New Jersey e Nova York.
Eu: ....
Cenário
2:
Ela: É verdade que fazes dobragens? O meu
amigo contou-me.
Eu: Sim, quer dizer, fiz formação e
frequentei estúdio X e Y, tive aulas com os atores Z e W, faço teatro na escola
N, mas maioritariamente ainda faço tudo para um canalzito de Youtube que vou
mantendo sem grandes euforias.
Ela: AH! Eu também fiz formação, tenho X workshops feitos, com W professores, e já falei pessoalmente com X, Y e Z estúdios!
Canto numa banda, tenho um videoclip, adoro fazer vozes infantis e estridentes,
a minha voz é perfeita para a personagem H ....
(cena continua em modo monólogo).
Cenário
3:
Eu: O meu namorado trabalha imenso, nem
sempre podemos passear, é conforme dá.
Ela: Ai, eu não tenho esse problema, o meu
namorado leva-me todos os fins de semana fora, ainda no outro dia fomos ao
Hotel X, muito in, foi DE-MAIS! Ele é muito atencioso comigo. Viajamos imenso. Quando
queremos muito, arranjamos sempre tempo e dinheiro, não é?
(cena continua em modo monólogo)
...
Se ainda estão acordados....
Senhoras, que desespero é este para
provarem umas às outras que as VOSSAS coisas é que são sempre as melhores? Em
conversas super banais que vocês fazem questão de transformar em autênticos ringues de
boxe entre experiências? Se vocês tivessem mesmo as melhores viagens, os
melhores relacionamentos, as melhores vidas, os melhores empregos... haveria
assim tanta necessidade em querer que as outras pessoas o saibam e vos dêem
um troféu por isso?
É claro quando a vossa intenção é fazer a
outra pessoa sentir-se inferior. Se eu disser que subi os Alpes, vocês não conseguem ouvir isso sem terem a necessidade imediata de
dizer que não só subiram o Monte Evereste, como também alcançaram a Exosfera e
foram as primeiras fêmeas a chegar a Marte. Yey!
(público aplaude)
Ah, esperem, afinal chegaram mas foi a Saturno! (Porque Plutão,
enfim, já vos faz parecer um bocadinho
para o fake, não é? Um bocadinho.
Mais a mais, ele coitadinho já nem é considerado planeta... Pois.)
(público fica desanimado)
Queridas colegas: Há mais no mundo para
além destes dramas e acredito que uma pessoa verdadeiramente ocupada, com
assuntos que interessam e com uma vida adulta por gerir, não perde tempo com
criancices destas, que não levam ninguém a lado nenhum. E sim, fala a pessoa
que faz desenhos e dobragens da Disney, que ainda pega num vídeo jogo ou que se
veste de Lara Croft na Comic Con. Aquilo que determina a nossa maturidade são
as nossas ações e os nossos comportamentos como cidadãos em sociedade, uns para com os outros.
Ser maturo não é andar a colecionar homens até aos 30 (e gabar-se disso), não é manter relacionamentos que vos
deixam tristes, sem terem a coragem de se imporem e de se libertarem, não é viverem à custa dos
pais até aos 40 e maltratarem-nos (sim,
conheço um caso gravíssimo). Também não sei o que há de maturo em invejar só
porque a pessoa é magra quando vocês também não experimentam fechar a boca ou tentarem mexer uma
palha pela vossa saúde e bem-estar, se realmente o querem; julgarem as vossas semelhantes sem as
conhecerem, quererem mostrar que tudo na vossa vida é um paraíso, ou acharem
que tudo na vida da outra pessoa o é.
Num mundo em que se apela tanto à igualdade
e à tolerância, não consigo deixar de sentir uma espécie de invejas e
ressentimentos mal escondidos entre as mulheres adultas de hoje, que se regem pela sororidade e feminismo, mas que são as primeiras a quem cai o disfarce de pesssoa bem resolvida com as outras, quando outra mulher a "incomoda". O ideal era que crescêssemos todas, e que percebêssemos que o mundo não gira só à nossa volta nem à volta das nossas
quezílias tontas e vazias umas com as outras. Que todos nós travamos as nossas
batalhas pessoais e que devemos ter o dever de não tornar o dia do Outro um dia
pior, seja através de comentários fúteis, conversas redutoras ou palpites
arrogantes, que em nada melhoram o mundo nem coisa nenhuma.
É importante trabalharmos para termos a vida,
a relação, o peso, o emprego que queremos. São batalhas NOSSAS. Enquanto as
travamos, há um mundo lá fora a precisar da nossa bondade, compreensão,
maturidade e força para o mudarmos. E força é algo que não nos falta a nós,
mulheres. Vamos ser melhores?